domingo, 14 de dezembro de 2008

Banco Mundial alerta que socorro financeiro pode prejudicar os mais pobres

14/12/2008 - 13h55

REUTERS

MIANYANG, China (Reuters) - As nações ricas devem ter cuidado para não causar mais sofrimento ao mundo em desenvolvimento ao tomar medidas mais ousadas para fortalecer suas economias fragilizadas, disse o presidente do Banco Mundial (Bird), Robert Zoellick, neste domingo.

Zoellick alertou que os países mais pobres, que já enfrentam grande perda de empregos, estão vulneráveis às conseqüências indiretas das políticas criadas para socorrer os mercados financeiros.

"Os países desenvolvidos garantiram muitos débitos bancários. Isso tornou difícil para os países em desenvolvimento, com bons programas orçamentários, conseguir lançar títulos no mercado", disse Zoellick em uma entrevista enquanto visitava a província chinesa de Sichuan, devastada por um terremoto em maio.

"É importante para os países em desenvolvimento reconhecer que em algum momento vão precisar de estratégias de saída para essas garantias ou ser capazes de discipliná-las", disse ele. "Não estou dizendo que devem tomar essa atitude agora, mas de outra forma os países em desenvolvimento vão arcar com o impacto disso".

O Banco Mundial disse na semana passada que o derretimento financeiro global está pesando muito nas economias em desenvolvimento, prevendo um crescimento de 4,5 por cento para o próximo ano diante dos 6,3 de 2008.

"Esta crise financeira virou uma crise econômica, e no ano que vem será uma crise de desemprego", disse Zoellick. "Será uma fase extremamente difícil".

Ele disse que a recuperação pode ser dificultada se os países se voltarem para si mesmos na tentativa de salvar suas economias, com pouca atenção para os outros.

"Estou preocupado que o desemprego, especialmente se combinado com os descontos nos preços, possa levar a ondas de protecionismo", disse ele.

Embora elogiando a expansão monetária e o estímulo fiscal nos EUA e em outras partes, Zoellick disse que tais políticas podem conter as sementes de futuros problemas econômicos, acrescentando que seria necessário disciplina para freá-las no longo prazo.

(Reportagem de Simon Rabinovitch)

ENTREVISTA COM KENNTH ROGOFF

O ESTADO DE SÃO PAULO
Domingo, 14 de Dezembro de 2008 | Versão Impressa
''Crescimento zero será bom resultado para o Brasil em 2009''
Professor de Harvard diz que País está mais bem preparado para enfrentar a crise, mas não tem como escapar de seus efeitos
Leandro Modé
O americano Kenneth Rogoff, de 55 anos, é um dos mais respeitados economistas do mundo hoje, o que não significa que seja unanimidade. Suas posições ortodoxas, muitas vezes expressas de uma forma contundente, nem sempre agradam ao interlocutor. Em 2002, quando era economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI), envolveu-se em uma polêmica pública com o ex-economista-chefe do Banco Mundial e ganhador do Prêmio Nobel, Joseph Stiglitz. O tema da contenda era globalização. Talvez pelo cargo que tenha ocupado, Rogoff procura manter-se atualizado sobre a economia de vários países. Esse conhecimento dá a ele a certeza de que o mundo está em meio à pior recessão desde a Segunda Guerra Mundial. Por isso, avisa: o Brasil deve dar-se por satisfeito se não enfrentar recessão em 2009. Rogoff, que hoje leciona na Universidade Harvard, conversou com o Estado, por telefone, durante uma viagem de trem de Boston para Nova York.

Leia a íntegra da entrevista

Em artigo publicado há duas semanas, o sr. disse que o maior problema dos países ricos é a recessão. Por isso, devem deixar os juros em segundo plano. O que dizer de países emergentes, como o Brasil?

Os países emergentes têm muito menos espaço para políticas contracíclicas do que os Estados Unidos e os efeitos da inflação são mais danosos. Nos EUA, a inflação reduz o valor real das dívidas e pode ser parte da solução dos atuais problemas. O Brasil não tem esse problema. Além disso, como a inflação no Brasil já é elevada, o Banco Central está entre a cruz e a espada.

Como assim?

A economia global está apenas entrando na pior recessão desde a Segunda Guerra Mundial. As commodities estão despencando e o mercado de crédito secou. Ou seja, é uma situação extremamente difícil e perigosa. O crescimento no Brasil certamente vai desacelerar. Mas, ao mesmo tempo, a inflação permanece elevada. Isso deixa ao Banco Central um espaço menor para responder como gostaria (à desaceleração). Além disso, o real depreciou-se fortemente. Reduzir a taxa de juros desvaloriza o real à frente. Mas, como os juros estão caindo rapidamente mundo afora, o BC brasileiro acabará reduzindo a taxa.

Quando?

Em breve (risos). Ainda que o Brasil esteja às voltas com preocupações inflacionárias, a economia global enfrenta o risco de deflação. Isso ocorre nos EUA, na China e na Europa. Os preços das commodities estão despencando e a produção industrial está caindo. O Brasil sentirá tudo isso logo. Quaisquer que sejam as pressões inflacionárias, serão revertidas em breve.

O sr. vê risco de recessão no País?

Há grande chance de o Brasil experimentar uma recessão suave. É quase impossível escapar disso, uma vez que se espera uma profunda recessão no mundo. O Brasil vai sofrer como todos os outros, mas não acho que sofrerá mais do que os outros. Todas as mudanças que o Brasil implementou nos últimos anos vão permitir que a reação seja muito melhor do que há 10 anos. É uma situação desastrosa, mas, em termos relativos, o Brasil está melhor do que muitos outros países.

Qual sua projeção para o crescimento do Brasil em 2009?

Crescimento zero será um bom resultado, levando-se em conta o ambiente global.

Mas as pessoas aqui falam algo entre 2% e 3%.

Elas são otimistas. A economia global está afundando muito rapidamente.

Qual o seu cenário principal para a economia mundial em 2009?

Como já disse, será a pior recessão desde a Segunda Guerra, mas nada que se assemelhe à Depressão dos anos 30.

O que o sr. espera especificamente para os EUA?

Uma recessão que dure 2009 inteiro. Em 2010 e 2011, o crescimento ainda permanecerá lento, abaixo de 2%. Os preços das residências continuarão a cair e o desemprego, a subir. Os emergentes também terão uma queda em 2009, mas se recuperarão mais fortemente em 2010 e 2011.

E o PIB (Produto Interno Bruto) americano em 2009?

Crescimento negativo entre 3% e 4%.

Com essa retração nos EUA, como fica o PIB mundial?

Pode ficar negativo, especialmente se a China desacelerar mais do que se espera. Isso ocorrerá certamente em um ou dois trimestres. Para o ano todo, espero um crescimento na faixa de 1%.

E a China?

A China também está sofrendo. Já esperava que a China poderia crescer no máximo 6% no ano que vem. Agora, não ficaria surpreso se o país crescesse menos ainda do que isso. Temos de cruzar os dedos para que a China não tenha uma ruptura econômico-social, porque isso poderia aprofundar ainda mais a recessão global.

Alguns países estão sofrendo mais que os outros, como, por exemplo, a Hungria e a Rússia. Por quê?

A Hungria teria uma crise financeira de qualquer maneira. Eles tinham um endividamento instável, uma situação fiscal ruim. A Rússia é outro assunto. É basicamente uma economia de commodity (petróleo). O sistema russo não estava preparado para um petróleo a US$ 40. Eles nunca permitiram que a economia se diversificasse. O Brasil, por exemplo, tem uma economia muito mais diversificada.

Qual sua expectativa em relação à administração Barack Obama?

Ele montou uma grande equipe, incluindo (Timothy) Geithner (que será secretário do Tesouro), (Larry) Summers (que será diretor do Conselho Econômico da Casa Branca) e (Paul) Volcker (ex-presidente do BC americano, Fed, indicado para dirigir um conselho destinado a propor soluções para a crise). Por si só, isso já inspira confiança. Obama fará um serviço muito melhor do que (George W.) Bush no que se refere às pessoas se sentirem assistidas, e isso vai melhorar o humor da população. A administração atual já está em férias. Mas não deve haver dúvidas: mesmo os melhores e mais brilhantes não serão capazes de resolver o problema da noite para o dia.